quinta-feira, 10 de maio de 2007

Mundo de vivência, convivência e inteligência

A cibercultura é uma mudança não apenas de mídia. Comparável somente à escrita e à imprensa, ela está causando tamanha transformação no modo de vida das pessoas que influencia não apenas as formas de relacionamento com a técnica e as mídias, mas uma transformação do próprio imaginário coletivo. A barreira de tempo e espaço está modificada, já que os limites não mais existem para a comunicação. Além disso, o espaço da rede é público. Isso desconstrói a noção moderna de privacidade, levando-a a tal limite de exposição que é possível, por meio de uma câmera instalada dentro do quarto, sobre o monitor, uma jovem de quinze anos tornar-se uma celebridade internacional, entrevistada até no programa de David Letteraman, o entrevistador mais badalado dos Estados Unidos. (Lonely Girl)
Eric Felinto defende que esta nova relação com a máquina é quase uma religiosidade. Isso parece curioso, uma vez que a rede não possui um centro. São bilhões de servidores interligados a todos os outros e sem nenhuma hierarquia. É um exemplo pleno de igualitarismo. O deus dessa rede é a vontade do usuário, que decide por onde navegar, com quem se comunicar e o que fazer. Jean Baudrillard, um filósofo francês falecido neste ano, era um dos críticos mais ferrenhos da cibercultura. Creditava a diminuição da experiência real a essa constante experiência virtual, que defendia ser ilusória, porque criada. A isso, chamava simulacro. Ironicamente, foi com base em seus pensamentos que Matrix, um dos ícones da contemporaneidade como prática valorativa, foi criado. Essa ficção propões um mundo totalmente criado pelas máquinas, em que os seres humanos vivem como escravos. Pierre Lévy, outro francês, mais jovem e ainda producente é o filósofo que mais defende a sociedade da informação. Ele propõe que está sendo criada uma nova forma de relacionamento entre as pessoas e entre elas e os conhecimentos que nunca se deu. E que isso não somente mudará a história, como melhorará as condições de vida, com dissolução de valores egoístas, transmutados numa política de colaboração massiva.
O isolamento, a privacidade, o individualismo, como disse anteriormente, são constructos tipicamente modernos, inaugurados pela corrente teórica do iluminismo, que deram a nossa sociedade muitas das características que ela possui. Uma das mudanças que a crescente participação das pessoas na rede seria a diminuição desses valores. Isso possibilitaria uma participação coletiva com senso de responsabilidade muito próxima da democracia constituída (e quase utópica). Além do mais, a produção de conhecimento e a autoria são visceralmente alteradas. Já questionada pelas correntes pós-estruturalistas de pensamento, esta seria dissolvida pela intertextualidade e a citação constante, de si e de outros, além de práticas constantes, embora legalmente ainda condenadas, como a cópia, a apropriação e o plágio.
A produção de conhecimento se altera na medida em que todos, de todos os lugares, podem falar, têm voz, e possibilidade de serem ouvidos enquanto produtores. Está claro que as instituições constituídas, seja de pesquisa, seja de veiculação, são as instâncias mais freqüentes e mais confiáveis, enquanto o assunto é conhecimento científico, ou “assuntos sérios”, por assim dizer. Mas não é raro a divulgação de notícias de listas de discussão ou comunidade virtuais que adquirem voz de autoridade em assuntos bastante polêmicos, como as recentes adolescentes que vieram a morrer em decorrência de transtornos alimentares incentivados em comunidades dedicadas a essas doenças. Outro exemplo menos grave dessa multiplicidade que ganha espaço na rede são os e-mails que lotam as caixas de entradas de qualquer internauta. Muito são de cunho pessoal ou profissional, úteis e necessários. Mas um grande volume parece ter vindo do além, tendo sido apenas passados, repassados, transpassados. Contém informações verídicas, muitas vezes, e até uma certa qualidade de lendas urbanas contemporâneas, que gozam de certa credibilidade embora ninguém saiba de onde surgiram. A fonte, nesses casos, deixa de importar. Isso tem facetas positivas e negativas.
Um dos grandes argumentos de Levy é a capacidade de auto-gestão da rede.Segundo ele os usuários são os responsáveis por dar à rede um mínimo de organização e indicar quais são as informações confiáveis e saudáveis. Os usuários, além de construírem, controlam a rede, bit por bit, filtrando as informações e utilizando-as conforme o contexto. Esse efeito de controle só pode se dar coletivamente. Por isso, decisões como a que proibiu o vídeo da modelo Daniela Cicarelli, em janeiro deste ano causam tamanha revolta e tão pouco efeito. Uma vez na rede, um conteúdo nunca pode ser retirado. Existem milhares de formas de acessá-lo. A única forma de isolamento é o esquecimento. Algo como o boca-a-boca acontece na rede. Links são recomendados, enviados e favoritados o tempo inteiro, e se determinado conteúdo faz sentido para alguém, ele com certeza será compartilhado, como uma propaganda voluntária.
Os argumentos contra e a favor da Internet são inúmeros e não me cabe aqui, nem esmiuçá-los nem decidir quais são convenientes ou não. Quero é me aproveitar desses aspectos positivos que relacionei acima para defender a utilização dessa tecnologia na sala de aula.

Nenhum comentário: